segunda-feira, 9 de abril de 2012

Vayerah

 

Bereshit 22:1-2

Haftara: 2 Reis 4:22-23

B’rit HaChadasha Marcos 5:34

A parashá de Vayera (Gênesis 18:1-22:24) contém uma das mais intrigantes e ao mesmo tempo significativa história das Escrituras. Não apenas da Torah, de toda a Escritura, Hebraicas e gregas, Antigo e Novo Testamento. É a história do sacrifício de Isaac, a Akedá.

O nome da parashá, vayerah, acentua sua ênfase no ver. Em cada uma das histórias contadas, o ato de ver é importante: Abraão vê os forasteiros, D-us desce para ver os pecados de Sodoma. A mulher de Ló olha para trás. D-us vê a angústia de Hagar e esta uma fonte de água. Por fim, Abraão vê um cordeiro para o sacrifício em lugar de Isaac.

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De cada trecho da parashá, de cada história contada é possível apreender significados. É possível extrair lições. A começar pela visita dos anjos. Perceba que não houve nenhuma teofania, não bradaram os montes, ou rugiram os ventos ante a presença do Eterno. De fato, aqueles homens nem mesmo se apresentaram a Abraão. Foi ele quem a seu encontro foi e lhes rogou que com ele compartissem uma refeição. Este era Abraão. O homem que amava. Aquele cuja perfeição era a perfeição do Amor, não apenas a perfeição do “obedecer” como Noé. Para Abraão, uma boa refeição era aquela que podia ser compartilhada com um viajante que lhe cruzava o caminho. Uma boa viagem era aquela que podia ser feita o lado de sua família. Este era Abraão. Um homem que amava. Tanto amava que, ao ser informado da impendente destruição de Sodoma, intercede. Simples assim: Intercede. De fato, ele não está interessado apenas em salvar alguns poucos justos, sua família. Ele quer a salvação de toda a cidade, por amor daqueles justos. Ele sabe o poder de transformação que vidas entregues a D-us, guiadas por D-us e ansiosas por D-us, podem ter em seu ambiente. Ele era assim: um homem de fé.

Não há nada impossível para D-us. Nem mesmo ignorar os pecados de uma cidade ou de uma geração, por amor a Seus justos; por amor daqueles que invocam o Seu Nome. Era este D-us, o Eterno, El Shaday, O juiz de toda a Terra que Abraão conhecia. E o conhecia de forma próxima, muito próxima, pois dEle recebera a promessa de que seria pai de grande nação.

Ainda assim, faltou algo. Faltaram fibra e verdade em um momento de incerteza e medo. E ele mentiu. O santo homem de Deus, a quem o Altíssimo não ocultou o segredo da destruição de Sodoma, com quem o Todo-Poderoso HaShem compartiu a mesa, mentiu. E não era a primeira vez. Pode soar estranho, mas este episódio me traz certa paz. É verdade. Paz, porque demonstra que não importa quão longe você vá, nem quanta bobagem você faça, D-us continuará te buscando. Paz, porque se um homem santo, que andava com D-us pode ser pecador como eu, ter as mesmas faltas que eu, errar naquilo que erro e ainda ser justificado, eu tenho esperança. Se ele andou pelo caminho que eu ando, posso também andar pelo caminho que ele andou. Se ele se sujou na lama que eu vivo, eu posso me lavar na água que ele se lavou. Se a ele foram feitas promessas, a despeito de seu ato errôneo, mas por seu certo e seguro arrependimento, a mim é estendida a mesma mão perdoadora e as mesmas palavras de promessa.

Abrãao falhou. Mas foi perdoado e chegou o tempo do nascimento de Isaac. Grande alegria e regozijo. Anos de prazerosa companhia. De acordo com a tradição, foram 37 anos de alegrias e companheirismo. Adonay cumprira Sua promessa: ele seria uma grande nação.

Então, O Eterno o chama e requer algo inimaginável: o sacrifício de Isaac. Como? Talvez nossa mente ocidental buscasse imediatamente uma racionalização: Mas, Adonay... ele é o filho da promessa... ele é o filho... ele é meu filho... ele é meu. Ele, ele, ele, meu, meu, meu, eu, eu. Talvez nossa mente desafiadora houvesse imediatamente retorquido: “Não Matarás foi o que o Senhor disse. Eu guardo tuas leis. Não vou matar meu filho. Esta voz que ouço não é a do Eterno.”, ou outras racionalizações e desculpas semelhantes.

Temos olhado este episódio, de forma correta, como um exemplo da fé de Abraão. Mas eu gostaria de propor que ele carregue outro propósito, outro contexto, e com isto outra lição. Quero propor que há no relato indicações de que Abraão, embevecido pela promessa, esqueceu-se do Deus da promessa. Apaixonado pelo filho que o Eterno lhe deu, começou a olhar menos ao Eterno que lhe deu o filho. É por isto que Deus lhe diz: “toma teu filho, teu único, a quem tu amas...” Veja como D-us se refere a Isaac: “Teu filho, Teu único, Tu amas”. Isaac era o centro das atenções do patriarca, ele era de Abraão, não mais de D-us. Ele era o sonho Abraão em realidade, não mais a promessa de Deus em carne. Por isso: teu.

Posso pensar como cada palavra de Adonay encontrava o coração de Abraão e como ele percebia o erro que havia cometido. Ele deixara de olhar para o Deus da promessa para olhar para a promessa. E D-us agora lhe demanda. Ele nada sabia quanto a ser um teste. Ele via apenas a realidade de seu ato. O que ele tomou como seu, D-us lhe faz lembrar que era dEle.

Imagino como foi aquela caminhada, pensativa e triste. Imagino a dor de Abraão ao responder a pergunta de Isaac quanto ao cordeiro. Não imagino, nem de longe, o que lhe haverá passado pela cabeça quando ergueu o cutelo para imolar ao próprio filho.

Releia a História e se coloque na posição de Abraão.  Qual é o seu Isaac? O que você precisaria colocar no altar de Moriá? O que terá D-us de te pedir em sacrifício? E, então responda a si mesmo, se teria a mesma presteza e obediência de Abraão: “Eis-me Aqui...”?

Sabe, talvez você esteja pensando em algo ruim e que te afaste de D-us. Pense mesmo. Mas Isaac não era algo ruim. Isaac era uma benção. Uma benção que se transformou em um obstáculo para outras bênçãos maiores.

Ali, na Akedah, Abraão entendeu isto. Quando D-us o chamou e impediu que ele sacrificasse o rapaz, ele entendeu que bênçãos só são bênçãos quando são utilizadas como bênçãos e servem ao propósito de D-us, que é o doador de todas elas. E por haver isto entendido, ali em Moriah, Abraão se torna o Pai da Fé.

Fé é a certeza daquilo que não se vê. Na história da Haftará, a hospitaleira sunamita, também não viu a ressurreição, mas creu. O que ela tinha de certeza, era seu filho morto nos braços. Como Abraão, era seu filho da velhice. Era fruto de uma promessa. E lhe escapava pelos dedos. Mas como Abraão, ela cria. E, crendo, buscou o profeta Eliseu, que intercede e D-us ressuscita do garoto.

No texto que lemos, o que mais impressiona é a resposta dela à inquirição do marido quanto ao motivo de ir ter com o profeta: “Fica em paz.” Mas será que ela mesma tinha esta paz?

Os versos lidos e os imediatamente anteriores dão a entender que ela possuía uma grande certeza na ressurreição do garoto. Mas ao chegar ao profeta, e derramar seu coração, Eliseu diz que ela era portadora de grande angústia. Onde está a paz?

Na fé! A fé não tira as angústias, mas alivia o fardo. A fé não remove o cansaço da caminhada, mas lhe dá sentido. A fé pode não impedir a morte, mas dá certeza da ressurreição. A fé não impede o sofrimento, mas enche de paz.

Ter fé, entretanto, não significa que não podemos chorar diante de D-us. Significa, sim, que choramos diante dEle, porque cremos que Ele é capaz fazer algo.

E este algo grandioso é o que é afirmado no texto da Brith HaChadasha, o Novo Testamento: “Minha filha, a tua fé te salvou... vai em paz.” Estas mesmas palavras, creio, ressoaram aos ouvidos da Sunamita: “paz... tua fé salvou o menino...” e de Abraão: “Vai em Paz... Tua fé salvou o rapaz”.

A Paz verdadeira que soou nos ouvidos de cada um deles é a paz do Messias, de Yeshua, de Jesus. Ele era aquele Cordeiro, que tomou o lugar de Isaac, para dar paz ao coração atribulado de Abraão. Ele tomou sobre si a morte que era do filho da Sunamita e deu ao garoto a vida que era Sua. Ele tomou a impureza da mulher e a extinguiu, pondo no lugar a Sua pureza e saúde. Ele é a paz verdadeira, Ele é a salvação. Por isso, pode dizer com autoridade “a tua fé te salvou... vai em paz.”

Estas palavras querem continuar aliviando dores e corações. Querem continuar abrindo ouvidos e olhos, e permitindo ouvir e “ver” (shama vayerah).

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